Gestão Ambiental Municipal e PMMA
Por Alexandre Aguiar
O assunto da gestão ambiental municipal não é novo. A questão da capacitação dos municípios para a gestão ambiental, tanto dos pontos de vista técnico e operacional (ter funcionários capacitados, equipamentos, etc.) quanto do ponto de vista político (estrutura de secretarias que inclua a gestão ambiental, conselho de meio ambiente atuante e deliberativo) vem sendo discutida. Além disso, a municipalização da gestão ambiental, reconhecida como importante devido à intensa interação com a política urbana e outras questões locais, vem sendo implantada de maneira bastante heterogênea no Brasil. Uns estados avançam mais rapidamente que outros, dependendo das condições políticas e outros fatores locais.
Essas questões acabam surgindo quando se fala dos Planos Municipais da Mata Atlântica. A gestão de florestas e áreas verdes é apenas uma das facetas da gestão ambiental que se relacionam tremendamente com as questões locais como expansão urbana, malha viária, saneamento e agricultura.
Um dos estudos mais abrangentes a respeito da gestão florestal e a municipalidade foi editado por Lyes Ferroukhi no livro “Municipal Forest Management in Latin America” (“Gestão Florestal Municipal na América Latina”), disponível em inglês e em espanhol.
O livro é uma coletânea de estudos realizados no Brasil, Bolívia, Honduras, Costa Rica, Nicarágua e Guatemala. No Brasil o estudo foi feito tendo como base a região amazônica, não a Mata Atlântica. Mas as conclusões são possivelmente genéricas e a maioria das pessoas envolvidas vai reconhecer situações similares em seus municípios.
No capítulo das conclusões, Anne M. Larson and Lyès Ferroukhi apresentam lições aprendidas consolidadas. Eles destacam que o processo de descentralização, para que as municipalidades passem a gerenciar e tomar as decisões sobre as florestas, ainda era incipiente na época. Os resultados variavam bastante de país para país e mesmo dentro de cada país. Destacaram também que a dinâmica da descentralização é muito afetada por aspectos socioeconômicos, tamanho da população, grau de urbanização e as características agroecológicas dos municípios. Apontaram ainda que a transparência no relato dos resultados da gestão ambiental florestal para a população local, a existência de alguma forma de agenda de desenvolvimento sustentável e a presença de organizações não-governamentais para suporte aos projetos podem contribuir significativamente para o sucesso dos projetos. Por outro lado, as barreiras destacadas são a existência de conflitos sociais, a propriedade privada das florestas e a resistência dos governos centrais em abrir mão de poder.
Os autores também destacam que a descentralização democrática da gestão das florestas não existia ainda (na época em que foi feita a pesquisa), e que tal democratização requer construir estruturas competentes para o desenvolvimento sustentável local, e mudar o papel da municipalidade nesta arena. Destacam também os principais desafios em quatro esferas principais para a municipalização da gestão florestal:
i – compromisso do governo central;
ii – um balanço adequado de poderes;
iii – treinamento e acompanhamento dos governos locais,
iv – democracia e equidade na esfera local.
No caso da Mata Atlântica, seria de se surpreender que a maioria dos municípios ainda enfrente desafios similares? Que tenham capacidade de gestão relativamente fraca, particularmente nas áreas com mais deficiências no desenvolvimento social?
Depois de dez anos da pesquisa publicada, mudou algo? Não temos como dizer, neste momento, que nos locais pesquisados pelos autores houve mudanças. No entanto, de maneira geral, pode-se dizer que os desafios continuam os mesmos. E também é possível dizer que não há uma solução mágica, única ou receita para enfrentá-los. Cada realidade local é diferente, tem suas condições particulares de realidade social, ambiental, econômica e política. O importante é que aqueles comprometidos com a conservação e a recuperação da Mata Atlântica tenham competência técnica para ajudar a sociedade a fazer escolhas sustentáveis, e competência política para transformar as escolhas técnicas em realidade, quando possível, e humildade para saber que em certas situações o “ótimo” é inimigo do “bom”, e às vezes é preciso fazer concessões para atingir nossos objetivos, pelo menos parcialmente.
Minha esperança é de que os Planos Municipais da Mata Atlântica sejam uma oportunidade para mostrar que estamos a caminho de desconstruir a realidade que os autores dos livros encontraram, e que tenhamos a competência técnica e política de fazer bons Planos Municipais da Mata Atlântica, que tenham condição de se tornar realidade nas mãos da comunidade, das administrações municipais e de todas as outras instituições que vão atuar na sua implementação.
Serviço:
“Municipal Forest Management in Latin America / Gestión Forestal Municipal en America Latina”. Editado por Lyes Ferroukhi. Co-edição: CIFOR e IDRC. Editado em Bogor, Indonésia, 2003.
Livro em espanhol disponível em: clique aqui.
Livro em inglês disponível em: clique aqui.